A decisão de Dias Toffoli no Supremo Tribunal Federal (STF), que beneficiou Marcelo Odebrecht, pode abrir caminho para beneficiar outros empreiteiros e condenados, somando-se a outros reveses enfrentados pela Operação Lava-Jato.
Toffoli decidiu pela “nulidade absoluta” de todos os atos praticados contra Marcelo Odebrecht nos processos da Lava-Jato, incluindo os determinados por Sergio Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba. Isso resultou no trancamento de todas as investigações contra o empresário. Embora a sentença não tenha anulado o acordo de colaboração premiada de Odebrecht, alguns ministros do STF entendem que a decisão individual de Toffoli atraiu um foco negativo para o tribunal.
A delação do empresário foi firmada pela PGR e homologada em 2017 pela então presidente da Corte, Cármen Lúcia. No entendimento de especialistas, este acordo poderá ser alvo de questionamentos, especialmente no que se refere à pressão sobre o empresário para obtenção de provas relativas ao esquema de propina entre empreiteiras investigadas e integrantes ligados aos governos do PT.
Cecilia Mello, criminalista e desembargadora aposentada do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), ressalta que os alvos da delação podem questionar a obtenção das provas, argumentando sobre a licitude das mesmas. Ela afirma: “A partir do momento que a delação surge em uma condição forçada, acho que você vai precisar verificar caso a caso a licitude da prova que o próprio Marcelo constituiu.”
Outra possibilidade apontada no STF é que a validade do acordo de Marcelo Odebrecht possa ser contestada pelos outros 76 delatores que à época eram executivos ou ex-executivos da empreiteira, na chamada “delação do fim do mundo”. Apenas Marcelo Odebrecht ficou preso, cumprindo uma pena estabelecida em 2015, enquanto os demais tiveram penas mais brandas, como pagamento de multas, prisão domiciliar e afastamento das funções de chefia da companhia.
Toffoli esclareceu que sua decisão não implicava a nulidade do acordo de colaboração e que, se a colaboração for efetiva e produzir os resultados almejados, o delator tem direito aos benefícios prometidos. Gustavo Henrique Badaró, professor de Direito Processual Penal da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), destaca que a decisão de Toffoli pode levar outros empresários condenados a recorrerem, embora os casos devam ser analisados separadamente.
A decisão de Toffoli, baseada nas mensagens apreendidas na Operação Spoofing, que investigou uma invasão a contas virtuais e de aplicativos de integrantes do Ministério Público Federal (MPF), revelou diálogos entre o ex-juiz Sergio Moro e o ex-procurador Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa. Segundo Toffoli, essas mensagens demonstram que “procurador e magistrado passaram, deliberadamente, a combinar estratégias e medidas contra o requerente, sobre o qual conversavam com frequência”.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, está avaliando a possibilidade de apresentar um agravo contra a decisão de Toffoli. Caso isso ocorra, o recurso deverá ser apreciado pela Segunda Turma da Corte, que historicamente tem uma postura crítica em relação à Lava-Jato. Gonet pode também solicitar que o agravo seja apreciado pelo plenário do STF, uma decisão que ainda está sendo estudada.
Este episódio é mais um revés para a Lava-Jato, somando-se à recente decisão do ministro Edson Fachin de arquivar um inquérito que investigava o senador Renan Calheiros (MDB-AL) e o ex-senador Romero Jucá (MDB-RR), atendendo a um pedido da PGR. Essa investigação, baseada na delação premiada de executivos da antiga Odebrecht (atual Novonor), foi aberta em 2017 e prorrogada diversas vezes. No mês passado, Gonet solicitou o arquivamento do caso, argumentando que os elementos de convicção obtidos ao longo da investigação não eram suficientes para oferecer denúncia contra os políticos.
Fachin justificou o arquivamento com base na ausência de interesse do Ministério Público, devido ao esgotamento das linhas de investigação sem corroboração dos fatos apurados. A praxe no STF é acatar um pedido de encerramento de investigação feito pela PGR. Renan e Jucá eram suspeitos de terem recebido propina de R$ 5 milhões em troca de uma suposta atuação em favor de uma medida provisória que beneficiaria subsidiárias da Odebrecht no exterior, embora ambos tenham negado as acusações.